sábado, 4 de setembro de 2010

A PARAHIBA RENOVADA!?

Vitoriosa a rebelião de outubro de 1930, o editorial do jornal oficial da Paraíba, A UNIÂO, entusiasticamente anunciava o raio dos novos tempos, o início da “renovação composta da política nacional”.

Será que houve renovação mesmo? Como? O que mudou? Tais questões somente a história pode responder. Assim, busquemos na história respostas a estas indagações. Porém, tenhamos cuidado, pois existem histórias e histórias, dependendo do olhar do historiador, das questões por ele colocadas e da leitura que ele faz das fontes pesquisadas.

À falta de outros testemunhos, procuremos resposta às indagações acima em diversas manifestações da própria elite política local: em seus discursos, em suas declarações na imprensa, em seus conflitos e confrontos com as camadas populares e nos seus conflitos e disputas internas.

Em primeiro lugar, é necessário salientar que o programa da Aliança Liberal nada tinha de revolucionário, limitando-se ao reformismo. Algumas declarações de suas lideranças deixam clara a preocupação em evitar que a rebelião avance no sentido da participação popular, conforme declarou Antônio Carlos e Getúlio Vargas:


“...revolta sim, reforma sim, mas longe do grave risco de perder o domínio sobre as massas suscetíveis de seduzirem-se por amantes inesperados e impetuosos. Nada de tocar nos alicerces sobre que repousa a estrutura social...” (GURJÃO, 1994: 83)


João Pessoa também demonstrou igual preocupação. Em meio às lutas que travava contra seus opositores na Paraíba e seu compromisso como candidato a vice presidente pela Aliança Liberal, consultado por um representante dos tenentes sobre seu apoio ao encaminhamento da rebelião armada, agito-se e declarou prontamente: “Prefiro mil Júlio Preste a uma revolução” (Idem,81).

Vitoriosa o movimento de 1930, a Paraíba passa a ter prestígio no cenário político nacional. Afinal, foram os último acontecimentos políticos da Paraíba que deram impulso à luta pela tomada do poder. Por conseguinte, as lideranças locais participantes desse movimento permaneceram no controle da política local e, logicamente, com seu poder reforçado.

Logo após a vitória do movimento armado, José Américo de Almeida(conhecido escritor, principal auxiliar da administração de João Pessoa e articulador do movimento de 1930 na Paraíba) foi nomeado interventor da Paraíba. Elevado, assim, ao principal cargo político do Estado, como uma homenagem que o líderes nacionais de 1930 prestavam à memória de João Pessoa, José Américo passou, então, à condição de herdeiro político do ex-presidente e principal líder político da Paraíba.. Após curto espaço de tempo na interventoria do Estado (04/10 a 25/11/1930)., foi nomeado ministro da Viação e Obras Públicas.

Em 1932 o Nordeste foi castigado por uma das piores secas de sua história e o ministro paraibano teve oportunidade, então, de aumentar seu prestígio através de sua atuação na política de obras contra as secas. Vale salientar a importância desta política no sentido de beneficiar os grandes proprietários de terras e de reforçar o clientelismo. Outro efeito das obras contra as secas deste período, que aliás, quase não é percebido foi o de garantir os novos ocupantes do poder, de construir para eles uma imagem altamente positiva, que lhes proporcionou crescente prestígio.

Desta forma, Getúlio Vargas aparece como o “Grande benfeitor do Nordeste” e José Américo como “O ministro das secas”. Aliás, o papel representado pelas obras contra as secas no sentido inicial do governo de Vargas, foi de fundamental importância para a legitimação do próprio movimento de 1930.

O jornalista Orris Barbosa que visitou a região das secas de 1932, ao mesmo tempo que descreve o drama das flagelados, mostra os investimento do governo federal e o empenho de José Américo para a realização das obras e conclui que:


“Do desespero de massas do Nordeste a Revolução de Outubro tirou o que podia tirar para alimentar a sua victória”... Por fim das contas, as obras contra as secas são, efetivamente, a página humana do outubrismo. Talvez a única. (BARBOSA, 1935: 191 e 197).


Na Paraíba, a imagem criada em torno da rebelião de 1930 foi ainda mais forte. Ainda hoje pode-se perceber a força desta imagem, cujas manifestações mais evidentes são: o nome da capital , mudando de Parahiba para João Pessoa e a bandeira do Estado, também trocada, cujas cores, preto e vermelho e o lema “NEGO” constituem homenagens ao ex-presidente e a todos que participaram do movimento de 1930 na Paraíba. Inclusive, é interessante observar que, ao mesmo tempo que se criavam as imagens de “herói” e de “mártir”, criava-se também a imagem da “Parahiba pequenina e forte”.

Assim, a Paraíba passa a se confundir com o símbolo da resistência de suas oligarquias.

Enquanto isto, as manifestações de resistência das camadas populares são tratadas como fatos estranhos e inaceitáveis, conforme ocorreu durante as greves operárias da Paraíba nos períodos de 1917 a 1928 e 1934 a 1936.

Mediante o crescimento das lutas operária, por ocasião da Velha como da Nova República as oligarquias no poder reagiram imediatamente, em duas frente. Através da imprensa, divulgando apelos para o retorno ao trabalho e alardeando o “despreparo” e a tradição de “cordura e patriotismo” dos trabalhadores paraibanos.

Assim, criam a imagem de um trabalhador pacifico, cordial, ordeiro, cuja rebeldia ora manifestada é fruto da influência de “elementos perturbadores da ordem vindo de fora”, de “comunistas”.

A Igreja católica também atuou neste sentido, utilizando seu jornal. A IMPRENSA, para reforçar essa imagem “acomodada” do nosso trabalhador.

Ao mesmo tempo, as autoridades governamentais reprimem as greve, através da atuação ostensiva da polícia, no sentido de “manter a ordem”. A repressão foi intensificada após o fracassado levante militar ocorrido em novembro de 1935. Conhecido domo “Intentona Comunista”, porque foi organizada pelo Partido Comunista, este movimento motivou sistemática repressão às lideranças de esquerda no Estado. A pretexto da existência de um plano para eclosão do movimento na Paraíba, inclusive publicado na imprensa, desencadeou-se numa verdadeira caçada ao comunismo e às oposições em geral, acusados todos de representarem “ao perigo vermelho”, “a besta apocalíptica”.

A repressão “preventiva” inviabilizou a participação da Paraíba no levante de 1935. situada entre Pernambuco e Rio Grande do Norte, Estados cujas capitais se rebelaram, a Paraíba funcionou como verdadeira barreira à articulação entre ambos e provável expansão do movimento. Além disto, a Paraíba exerceu um papel significativo no combate às rebeliões vizinhas, através do envio de forças militares, bem como de destacamentos provisórios organizado e enviados por “coronéis” que habitavam nas fronteira com Natal e Recife.

Debeladas as rebeliões de Recife e Natal, a ação repressiva na Paraíba efetivou-se de tal forma agressiva, como se a Paraíba tivesse participado também no movimento. Segundo relatório da Delegacia de Ordem Política e Social, havia um plano de participação da Paraíba, contendo, inclusive, os nomes das pessoas a quem caberia executá-lo. Com este pretexto, muitos trabalhadores e intelectuais foram presos, e alguns prestaram depoimento sob “ameaças, violência e espancamento”, conforme dito por Horácio de Almeida em seu requerimento de “habeas corpus”.

Decretado o estado de guerra, a repressão tornou-se mais rigorosa e sistemática.

Em outubro de 1937 já se encontravam instaladas e em pleno funcionamento na capital do Estado, comissões responsáveis pela fiscalização, propaganda e doutrinação anti-comunista, contando com apoio da Assembléia Legislativa e a colaboração da Igreja Católica.

Como resultado de todo este aparato repressivo a classe trabalhadora paraibana foi amordaçada, desde 1935. Suas entidades, tais como associações e sindicatos que vinham caminhado no sentido da organização da classe foram desviadas, passando muito mais a desorganizá-la, atuando como legitimadoras da ordem vigente. Consequentemente, a presença operária na cena por muito tempo, a apoiar os candidatos das oligarquias dominantes.

As disputas entre as oligarquias nos poder e aquelas que ficaram fora dele a partir de 1930 são constantes e demonstrativas da continuação da política tradicional, da sobrevivência dos velhos métodos de fazer política. Logo após a vitória de 1930, o grupo no poder enfrentou a oposição de ex-correligionários, insatisfeitos com a distribuição de cargos e privilégios.

Ao mesmo tempo, a ascensão de José Américo passa a incomodar. O argumento mais utilizado por ambas as facções era “o sacrifício do grande presidente”, a herança política do assassinato de João Pessoa. Os que assumiram o governo, declaravam-se continuadores da obra de João Pessoa, enquanto seus opositores, evocavam a memória de João Pessoa para lamentar os rumos tomados pelo movimento de 1930.

Durante a campanha eleitoral de 1933 as disputas entre a elite política da Paraíba foram acirradas. As facções (P.P e P.R.L.), utilizaram a velha máquina dos “coronéis”, concorrendo pelo interesse de controlar a distribuição de cargos e favores.


Autora do texto : Eliete de Queiroz Gurjão.

Fonte: Estudando a História da Paraíba.


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